Na política, alguns pensadores são classificados como contratualistas, pois defendem que a sociedade, ao invés de ter se fundamentado naturalmente, é o resultado de um acordo das vontades das pessoas. Assim, sugerem que houve um contrato hipotético. Entre eles, há John Locke, Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau. Apesar dessa semelhança, cada um tem as suas próprias convicções em relação aos conceitos expostos por eles, como a liberdade, por exemplo, o que permite que seja feita uma comparação entre os autores.
Nos estudos dos três filósofos, inclui-se também o conceito de propriedade privada, onde cada um deles o expõe de maneiras diferentes. Comecemos por Thomas Hobbes, que negava o direito natural à propriedade. Para ele, o Estado deve proteger tudo o que ao homem pertence, garantindo o sistema de propriedade individual, pois para esse autor a propriedade privada não existia no estado de natureza onde todos têm direito a "tudo", mas na verdade "ninguém" tem direito a nada. Somente após o surgimento do Estado, foi possível garantir a posse da propriedade privada e sua utilização de forma equilibrada e garantindo a coesão e ajustiça social. De acordo com ele, Estado é a condição para a existência da sociedade e da propriedade, pois, fora dele, a ganância colocaria em risco a vida dos indivíduos. Com um pensamento semelhante, Rousseau também defende que o direito de propriedade somente é possível em consequência da formação do Estado. Este segundo pensador dizia que o criador da sociedade é a propriedade privada. No momento em que todo território é cercado, se torna privado e os indivíduos que não possuem propriedades são obrigados a se render ao trabalho para aqueles que têm. É importante ressaltar que para Rousseau, o homem se corrompe de fato após a instituição da propriedade privada, que irá estimular e perverter sentimentos de caráter egoístas e mesquinhos.
O pensador iluminista John Locke acredita na união das pessoas para gerar um Estado harmonioso, ao contrário de Rousseau ele tinha um pensamento radical, o qual dizia que a terra é do individuo porque ele trabalhou naquele local. Sua característica em comum com Hobbes é o "individualismo possessivo", pelo qual, "a essência humana é o ser livre da dependência as vontades alheias, e a liberdade que existe como um exercício de posse". Isso significa que para Locke todos somos proprietários, mesmo aqueles seres humanos que não possuem nenhum bem é proprietário de sua vida, de seu corpo, de seu trabalho, afirmando com a seguinte consideração “Embora a terra e todos seus frutos sejam propriedade comum a todos os homens, cada homem tem uma propriedade particular em sua própria pessoa; a esta ninguém tem qualquer direito senão ele mesmo.” Ainda sobre esse pensador, concluímos que para ele e a propriedade existe de fato quando o homem passa a trabalhar a terra. Se o título de posse da propriedade não é o contrato, se não existe uma relação jurídica entre dois ou mais indivíduos, há de se dizer que se está diante de um fato unilateral e verdadeiramente natural, que é o trabalho. Ou seja, a propriedade é legitima quando não monopolizada por um indivíduo ou por uma classe de indivíduos.
Retomando o conceito de estado de natureza de Hobbes, um estado hipotético dos primórdios dos seres humanos, supõe uma liberdade ilimitada e sem regras para a preservação da vida. Ela, juntamente com a ideia de homem opaco e de igualdade, caracteriza o resultado de um mundo caótico e tenso. O contrato social, também hipotético tiraria o caráter livre do homem, pois ele seria controlado pelo soberano que teria o mesmo objetivo de lutar pela vida de seus súditos. John Locke refuta esse pensamento com sua influência ideológica do liberalismo, defendendo pela primeira vez a liberdade e o governo misto. O homem passa a ser proprietário de sua vida e, portanto, de sua liberdade. A ideia de liberdade se junta a ideia de maioria. Já em Rousseau, a visão pessimista de que a liberdade natural não existe cria o conceito de vontade geral. O que existe é um Estado que só opera com os desejos da população, submetendo-se, pela primeira vez, o governo ao povo, acabando com o que se conhece como representação política. O homem deve estar sempre vigilante para que a vontade geral não seja substituída pela vontade individual.
Cada um deles tem a sua concepção própria sobre o estado de natureza do ser humano. Para Rousseau, os indivíduos estão isolados pela natureza e sobrevivem daquilo que esta oferece. Este estado de felicidade e contentamento acaba quando um indivíduo cerca um lugar e intitula aquele pedaço de terra como dele. Em outras palavras, a felicidade dos indivíduos acaba com o surgimento da propriedade privado. Assim, o estado de sociedade, que se dá a partir deste momento, é um estado de guerra constante. Já na concepção de Hobbes, o estado de natureza é o estado de sociedade de Rousseau, onde os homens vivem isolados e em luta permanente. Este estado é formado por homens opacos, homens que por só saberem o que se passa na sua cabeça e não na dos outros, ataca-os por medo de serem atacados. O estado de natureza de Hobbes e o estado de sociedade de Rousseau mostram uma percepção do social como luta entre fracos e fortes, onde o poder da força sai vitorioso. Para acabar com esse estado de vida, os indivíduos decidem passar a uma sociedade civil, ou seja, ao Estado Civil, onde será criado o poder político e as leis. Para Locke, o estado de natureza, por mais pacífico que pareça, não está isento de violações de propriedades, que pela ausência de leis, leva os indivíduos ao estado de guerra. O contrato social desse grupo é escrito de maneira autônoma e tem como objetivo a preservação da propriedade privada e da comunidade.
A partir dessa análise, as grandes divergências entre esses pensadores se tornam muito claras. Cada um desenvolveu sua tese de acordo com o seu contexto histórico, o que, em partes, gerou essa disparidade profunda. Hobbes fundamentou o absolutismo quando garantiu a soberania e o poder ilimitado ao Estado. Enquanto isso, Locke defendeu o liberalismo ao enunciar os direitos do indivíduo à vida, à liberdade e à propriedade. Em contrapartida, Rousseau instaura ideias revolucionárias à medida que torna o povo soberano e acredita que ele pode reivindicar caso o seu interesse não seja atendido. Torna-se então evidente que cada autor seguiu as suas próprias tendências, mas que todos compartilharam da mesma ideia, a de que, em algum momento no passado remoto, as pessoas tiveram a vontade de se agrupar para criar uma sociedade.
Flávia Fernandes Antoniolli, RA00113155
ResponderExcluirO texto está muito bom. Oferece um panorama das teorias de três importantes pensadores que, entre os século XVII e XVIII, adorarem o contratualismo. Apesar disso Locke, Rousseau e Hobbes foram teóricos que inspiraram processos políticos muito diferentes entre si.
A obra de Thomas Hobbes surgiu em um período em que o teocentrismo já não tinha força e era explicita a necessidade de um teórico que justificasse o poder absoluto de um monarca. Mais tarde, John Locke ganhou importância no cenário político inspirando o liberalismo. Critico do poder divino do rei, suas ideias foram fundamentais para a queda do absolutismo inglês. Locke acreditava que todos os homens tinham direto natural à vida, à propriedade e à liberdade. Já Rousseau teve suas teorias usadas como base para as Revoluções Iluministas. Tido como o primeiro revolucionário, ele acreditava que o Estado deveria ser pautado pela vontade geral em que o povo deliberasse suas próprias leis.
Dentro do processo de mudanças políticas, a evolução do pensamento constratualista delimita os mais importantes eventos históricos que alteraram a vida em sociedade. Hobbes adequou-se a ascensão do poder de reis absolutistas. Quando a classe burguesa começou a se destacar, principalmente na Inglaterra, o pensamento de John Locke foi valorizado. Já Rousseau sobressaiu quando a burguesia se tornou a classe mais poderosa economicamente e com desejo de obter poder político. Assim, cada nova abordagem do contrato social refletia o período histórico que o mundo enfrentava.