Para
explorar a manipulação midiática é possível utilizar como base argumentativa os
estudos de Thompson, Bourdieu e Sartori. Como foi percebido no caso das
eleições de 1986, a qual tinha como candidatos Collor e Lula, o controle da
mídia pode influenciar até os fatores de maior importância social de um país
inteiro. Nesse pleito, a Rede Globo transmitiu o debate entre os dois possíveis
presidentes durante a madrugada, de um dia de semana. Com isso, a emissora
dificultou o acesso para a maior parte dos telespectadores. Após essa
transmissão foi feito um resumo do debate, com edições que prejudicavam Lula e
vangloriavam a candidatura de Collor. Tendo em vista a grande repercussão que a
Rede Globo tem na sociedade brasileira, compreende-se o resultado final com
vitória exorbitante de Collor. Portanto, é de extrema importância a
explicitação desse conceito para o cenário do país.
John
Thompson, sociólogo inglês, propõe que manipulação é “por as mãos em algo”.
Logo, a mídia não manipula pessoas, mas sim as informações que serão divulgadas
à população, já que ela não pode o ser, justamente por ser capaz de tomar
decisões autônomas. Os indivíduos possuem, por si só, uma habilidade que os
torna capaz de agregar a mídia à sua vida pessoal, pois em seu dia a dia
debatem todas as mensagens recebidas pelos veículos de comunicação.
O autor
articula o processo de transmissão informativa colocando entre o emissor e o
receptor uma flecha, que representa a mídia. Assim, o primeiro pode ser visto
como uma ferramenta para que o poder seja eficiente sobre o último. Thompson
cria uma tipologia de poderes, são eles: político, econômico, coercivo (de
persuasão, força) e simbólico (midiático). Os quatro se
relacionam, porém, dependem do simbólico para se efetivar.
Mesmo com
o poder do emissor, o receptor tem intencionalidade, ou seja, poder de
resistência. Assim sendo, o sistema entre emissor e receptor do sociólogo, não
é matemático. Além disso, esses dois membros podem se confundir, em uma
conversa, por exemplo.
“Finalmente,
a recepção dos produtos da mídia é fundamentalmente um processo hermenêutico.
(...) a recepção de um produto da mídia (...) implica um certo grau de atenção
e de atividade interpretativa da parte do receptor.”, dito em “A mídia e a
modernidade – uma teoria social da mídia”, na página 44. Portanto, para o
autor, a hermenêutica, capacidade de interpretação que permite a
idiossincrasia, ou seja, a variedade de pontos de vista a respeito de algo, é o
cerne da relação midiática.
Tendo em
vista a teoria estruturalista sobre o campo do jornalístico de Pierre Bourdieu,
todo espaço reservado para as notícias são insuficientes para representar
fielmente a realidade. Por isso, acaba na banalização e na simplificação do
fato. Para o sociólogo, o campo jornalístico é determinado e influenciado por
um campo político e um campo econômico. As notícias, portanto, quando
publicadas são condicionadas diretamente pela força desses eixos.
O
indivíduo é condicionado pelo hábito imposto pela Indústria Cultural a ter uma
percepção da realidade de forma simplificada, ocupando seu tempo com
banalidades. Para ele, as notícias são recortes e interpretações passadas
adiante que reduzem o real. Sua metodologia de análise televisiva avalia a
reportagem perante dois fatores: o primeiro de apenas descrever o acontecimento
e o segundo, além de descrever, apresenta também um comentário, uma
interpretação, induzindo o telespectador a receber a notícia já condicionada
por outros interesses, econômicos e políticos influenciando em sua opinião.
Bourdieu
ao analisar a grande capacidade de audiência que a televisão pode atingir
reflete, em “Sobre a televisão”, na página 63: “Quanto mais um órgão de
imprensa ou um meio de expressão qualquer pretende atingir um publico extenso,
mas ele deve perder suas asperezas, tudo o que pode dividir, excluir (...), mas
ele deve aplicar-se em não ‘chocar ninguém’, como se diz, em jamais levantar
problemas ou apenas problemas sem história.”. Desse modo, esse veículo de
comunicação segue “um roteiro”, ou seja, transmite, na maior parte das vezes, o
que o telespectador quer e está habituado a consumir. Toda essa lógica se
insere na Indústria Cultural, que transforma o ordinário em extraordinário.
O
italiano Giovanni Sartori analisa em seu livro “Homo videns” o vídeo e sua
interferência na vida humana. O sociólogo ataca a Industria Cultural, se
concentrando no surgimento da televisão, que acabou mudando a forma com que o
ser humano compreende o mundo.
Segundo Sartori, o que diferencia o Homo sapiens dos demais primatas é a sua
capacidade simbólica. O filósofo alemão Cassirer diria que isso é possível por
causa do desenvolvimento humano através da língua, do mito, da arte e da
religião; todos estes compreendendo as formas da vida cultural do homem. A capacidade
simbólica do homem se dá pela linguagem, que por meio dos signos produzem um
significado.
A diferença da linguagem humana é que ela pode falar de si própria, a
metalinguagem. Assim, ele reflete sobre aquilo que diz e como irá dizer. Por isso,
a língua não é somente uma forma de comunicar, mas também de pensar. Essa
teoria pode ser contestada pela maneira que o homem vive com os avanços
tecnológicos de hoje.
A invenção da televisão é a que mais interessa para a análise do autor. Até
então, o ser humano tinha duas direções de visão extra-humana: o microscópio e
o binóculo, que atuavam inversamente. A televisão e mais tarde a cybercultura
possibilitaram a visão do homem sem ele precisar ir até o local para ver. A
cybercultura vai mais além porque possibilita a criação de universos
imaginários.
Com a TV a natureza da comunicação, antes sendo a palavra impressa ou
radiotransmitida, é incorporada pela imagem. Assim, Sartori acredita que ela
deixa de ser um acréscimo para o homem e passa a substituir, invertendo a
relação entre compreender e ver. A televisão cria um novo tipo de ser humano. A
“videocriança”, como é denominada, ao se tornar adulta continua surda aos
estímulos transmitidos pela cultura escrita, atendendo somente aos estímulos
audiovisuais.
Ao inverter o progredir do mundo sensível para o inteligível do ser humano, ela
atrofia a capacidade de abstração e compreensão, produzindo imagens e apagando
conceitos. O autor cita Kant, que dizia que a ideia é um conceito necessário da
razão, ao qual não pode ser dado nos sentidos qualquer objeto adequado,
portanto aquilo que vemos com os sentidos não produzem e sim insere-se em
conceitos. O Homo sapiens é suplantado pelo Homo videns.
A política nesse âmbito se transforma em videopolítica, pois a TV informa
através das notícias sobre a política local e mundial, ao mesmo tempo em que
diverte e distrai. A televisão é formadora de opinião, condicionante do
processo eleitoral e do governo. As pessoas em frente a tela ficam cada vez
mais distantes da criticidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário